Policiais em ação. A tragédia da vida privada de uma classe. Foto: Band |
Se é certo
que muitos consideraram e ainda consideram a religião “o ópio do povo”, é
igualmente sensato ampliar a gama desses opiáceos num conjunto facilmente detectável.
Os “casos de polícia”, a exemplo do evangelismo empresarial, tomam cada vez
mais espaço no circo televisivo, e os programas desse teor reproduzem efeitos
socialmente nocivos em larga escala.
Com o
faroeste caboclo ganhando diariamente as telas domésticas, alarga-se cada vez
mais o maniqueísta abismo entre mocinho e bandido. Os maus elementos são
heroicamente combatidos pela polícia e “a lei” triunfa soberana sobre o mal.
No entanto,
não só “a lei” carece de constantes revisões, mas também os efeitos de uma
espetacularização desses casos de polícia e de tragédias. Vil entretenimento, miserável
recreação. Realçam-se acidentes, arrastões, assaltos, atropelamentos e o
alfabeto é extenso pra tanta mazela.
E a polícia,
onde entra nesse recital de desgraças? Aliás, qual o papel da polícia numa
sociedade? Pergunta insolente e vasta é a discussão, pense com seus botões.
No
espetáculo do submundo, nesse bang-bang urbano televisionado, cada vez mais se
legitimam a existência da polícia e seus atos, sejam esses quais forem.
Novamente vale lembrar: “a Rota nas ruas”, para quem? Vez ou outra para aqueles
que continuam fieis espectadores dos “casos de polícia”, mas sabemos que da
classe média para baixo a polícia é outra.
Como
entretenimento, os “casos de polícia” vão na contramão de qualquer movimento de
emancipação educacional e elucidação política. Panis et circenses, desse tipo que abusa da tendência humana à
comoção, à tragédia do próximo.
Como
entretenimento informativo, legitima-se o poder policial no discurso popular. “Vagabundo
tem que ir pra cadeia”, e ainda ecoa-se nos corredores do alienismo político
conservador: “baderneiros”, “maconheiros”.
Fatalmente, os
telespectadores desses desfiles de flagelos protagonizam um ou outro programa.
O ciclo se alimenta. A força policial prestigiada pelos telespectadores aumenta
ainda mais seu poder. Mais uma vez o ciclo se alimenta, qualquer alternativa ao
estado policial se vê desarmada ante tanto prestígio, que fazemos?
Ora, bônus
dos grandes meios de comunicação que transmitem o espetáculo das catástrofes
urbanas e sociais, e arrecadam com anunciantes. É o sistema. Bônus também do
governo policial, sobretudo estadual, a quem a polícia responde.
Já o ônus
fica nas ruas. É do pobre que trafica porque consegue dinheiro. Do vagabundo
que rouba porque não consegue trabalho. Do drogado que não vê a luz no fim do
túnel. O ônus é o único que é bem distribuído nesse ciclo policial opiáceo. É o
sistema.
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