O brasileiro, assim, genérico, não é o que cada um de nós gostaria.
Cada cidadão tupiniquim achamos que o brasileiro deveria ter um raciocínio mais crítico, um costume de leituras maior, de melhor qualidade, que deveria ver menos tv, passar menos tempo no Facebook, beber vinho branco ao invés de cerveja.
Uma série de melhores costumes. Um povo mais sublime, mais elevado. Um povo qual nossa própria imagem e semelhança.
Porca ilusão, nem a imagem que o espelho nos esfrega na cara reflete um sujeito desse tipo. Esse sujeito dos melhores costumes não é um brasileiro. Somos qualquer outra coisa menos burocrática e talvez até indolente, mas outra coisa.
E uma outra coisa seguramente melhor do que essa coisa tabela de cossenos de melhores costumes. Contudo, nossas peculiaridades não nos fazem perfeitos. E isso é suficiente para que nos afete a "síndrome de terceiro mundismo", expressão que por si só já revela um punhado de preconceitos.
Como gostaríamos que o brasileiro, desleixado, gostasse de política e não fosse tão suscetível ao paternalismo de determinados políticos. Que o voto fosse ideológico e não personalista. Será que, para o bem e para o mal, o brasileiro já não é assim?
Daí, o cara vê o país prestigiado pelo mundo e sua mesa menos minguada que na década passada, mas, se vota no cachaceiro que é responsável por isso - sem tirar o mérito do sociólogo e de sua equipe de economistas que anteriormente vestiam a faixa presidencial - é apenas uma vítima do populismo, não é crítico. Talvez o cabresto esteja em outras vistas e é o crítico que não consegue enxergar.
O voto personalista remete a eleição federal, mas e quanto as outras instâncias? quem vota no Serra votaria em outro partido se Alckmin fosse o candidato escolhido pelo PSDB? Quem vota no PT mudaria seu voto se Mercadante for candidato no lugar de Marta? Estamos partidarizados sim.
Prova disso é o câncer de Lula e as manifestações de ódio polarizadas entre os que aprovam o projeto petista e os seus adversários. Estamos, como na bicentenária democracia estadunidense, divididos entre duas posições políticas reais e várias outras de efetividade quase imaginária. Chegamos a este nível.
Temos um Tea Party, temos um partido de centro que pensa que é esquerda e outro conservador que pensa ser de centro. E temos hooligans defendendo as duas bandeiras. O sérgio Buarque dizia que somos um povo cordial, que é uma espécie de eufemismo para dissimulado. Não somos mais. Vide o "Partidarismo Esclarecido", que não respeita nem doente. Valeu a pena?
segunda-feira, 31 de outubro de 2011
quarta-feira, 26 de outubro de 2011
“As sombras de tudo o que fomos nós”
Foto: ?
“Se você
quiser me destruir, vou te destruir primeiro”. Teria sido essa indelicada declaração,
segundo consta, que inaugurou a desforra de Gilberto Kassab a Rodrigo Garcia, até
então sua eterna metade da laranja. Chega um momento na vida a dois em que a
fidelidade é abalada, em que surgem terceiros, e as mágoas irrompem do
não-dito. São as escuras nuvens do divórcio.
São Paulo
assiste passivamente aos “DR” do alto clero da política local. A briga na corte
é forte, ameaça a dinastia tucana e confessa a debandada dos oportunos
integrantes do PSD. Anos de afeto, jingles e presentes abalados pelo “salve-se
quem puder” de Kassab e seus novos amigos.
Já não se
sabe, aqui em baixo, quem governa a maior cidade do país. A descaracterização
governamental é refletida nas políticas confusas e eleitoreiras do prefeito
que, apesar do que faz, agora se diz socialista. São Paulo passa mal, e somada
à enferma cidade está o processo diaspórico de inauguração do PSD.
E os
paulistanos, devem estar indignados com toda essa picuinha, não? Não. Não se
percebe. Enquanto a vaidade esfria a brasa de Kassab e Garcia, estamos no
trânsito ou na balada, temos os nossos amores pra cuidar, eles os deles.
O PSD
conseguiu nascer, parto dificultado por Rodrigo Garcia (tu quoque?) e seu DEM.
Não são tão adversários hoje, aquela ternura sempre fica, não fica? O partido
de Kassab esvazia o DEM. Mas Rodrigo e seus parceiros não vão dar ao prefeito o enorme prazer de lhes ver chorar.
O estoicismo
que cabe aos barões do DEM também não importuna Kassab. O que ele quer é seguir
em frente, esquecer que aquela união, por mais afetuosa, poderia lhe render
rejeição popular. Flerta com quem tem aprovação do público votante.
Depois de
muitos anos juntos, foi difícil até para a mãe de Rodrigo Garcia aceitar a
separação. As coisas são assim mesmo, crianças. Se não se cultiva a relação, a
menor das brisas desfolha a árvore, galho por galho.
Os ânimos já
amainaram e Kassab ainda acha que está fazendo o que é certo, pela política e
pela cidade. E assim, os sabores e dissabores das paixões da fidalguia paulista
sobressaem ante as necessidades da plebe paulistana. Estamos acostumados mesmo
a torcer pelos amores impossíveis de novela e a esquecer os nossos próprios
desejos.
sábado, 22 de outubro de 2011
CBF: Covil Brasileiro do Fisiologismo
Já não é segredo, nem novidade, que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) é um tonel de anomalias. A entidade é responsável por uma das maiores alegrias do brasileiro, o futebol, instituição cultural nacional, quiçá mundial. Sua atual estrutura e seu regimento não fazem jus ao novo e crescente movimento por transparência e democracia, que abala a cultura oligárquica que tanto tem perdurado em solo brasileiro.
Foto: Agência Estado
É possível
conhecer a estrutura da instituição pelo seu site. Conhecemos o nome do
presidente, vice-presidentes regionais, secretário geral, diretores e toda a
hierarquia detalhadamente desenhada. Inclui-se nessa apresentação, a posição
destacada das federações estaduais, se é que podem ser legalmente assim
definidas.
Trata-se de
uma instituição privada, gozando dos direitos de associação que a Carta Magna
assegura em seu Art. 5º (XVII). E que fique claro que essa liberdade assegurada
pela constituição se refere a “associações para fins lícitos”. Juridicamente a
CBF tem, logo, direito de auto-organização e de auto-regulação.
Pouco se
sabe, entretanto, do estatuto e consequente regimento interno da CBF, uma vez
que não estão acessíveis no site. Mas é de quase conhecimento público que o
presidente da entidade é eleito por votação. Têm direito ao voto as 27
federações filiadas à CBF, apesar de Roraima misteriosamente não constar na
estrutura interna, mais 24 clubes.
O
obscurantismo por trás da eleição do presidente é tal que alguns fatos atraem a
atenção:
- Na última
eleição, em 2008, votaram as 27 federações estaduais e presidentes de 24
clubes, quais sejam esses times: a escuridão não me permitiu averiguar;
- Essa mesma
eleição foi alterada em 18 de abril de 2006 pela Assembléia Geral da CBF para
que, assim que eleito, o próximo presidente perdurasse no cargo até 2015, sendo
que a eleição segue normalmente o intervalo de 4 anos;
- Na eleição
de 2008, Ricardo Teixeira enfrentou chapa concorrente de Carlos Alberto
Oliveira, então presidente da Federação Pernambucana de Futebol, falecido no
final de agosto de 2011. Uma das propostas de Carlos Alberto era a de ampliar o
sufrágio para eleição do presidente da CBF, com participação dos clubes da
Série B, Série C e da Copa do Brasil, uma vez que todos esses torneios são
organizados pela CBF;
- Favas
contadas: a dinastia Teixeira persiste até 2015. Ricardão pode levantar o dedo
e afiançar: “La CBF c’est moi!”.
Dentre os 5
vice-presidentes de Teixeira, consta o nome de Fernando Sarney, que também
ocupa os cargos de filho do homem e de alvo da Operação Faktor da Polícia
Federal, operação omitida pela TV Mirante, afilhada da Globo em São Luís e
motivo de censura por parte do desembargador Dácio Vieira do TJDFT ao jornal
Estado de São Paulo.
No início
desse ano o deputado Anthony Garotinho (PR/RJ) iniciou empreitada na casa para
a criação de uma CPI da CBF, e conseguiu coletar assinaturas. A CPI investigaria
irregularidades sobre Teixeira ser um dos dois sócios, como pessoa física, do
Comitê Organizador Local da Copa de 2014. Teixeira teria 0,01% das ações
enquanto a outra sócia, a CBF, teria os 99,9% restantes.
Alguns
deputados mantiveram a assinatura e outros retiraram as suas, talvez, em troca
de uma camisa da seleção ou coisa que o valha. Um dengo de Dom Teixeira. Veja alista.
Poderia arrazoar
aqui todas as denúncias de irregularidades: as negociatas de bastidores entreCBF e Globo, dívidas com o Fisco, lobby na Casa para não instalação da CPMI
Corinthians/MSI no trágico episódio do clube, as doações irregulares a campanhas
políticas, o esquema milionário de propina, o recente patrocínio à copa dosjuízes federais e grandes feitos afins.
Sem contar o
tradicionalmente desorganizado calendário da CBF, com partidas oficiais marcadas
em datas FIFA e durante as olimpíadas de Londres, prejudicando os clubes
brasileiros que cedem seus jogadores à seleção.
No entanto,
com receio da prolixidade, atenho-me a mostrar, com a clareza que esse covil me
permite, o quanto o futebol brasileiro, de interesse público, é refém do
negócio privado, corporativista, corrupto e fisiologista.
sexta-feira, 14 de outubro de 2011
Por quem esses sinos dobram?
Declaradamente
aberta a temporada de caça à corrupção. Esta puta corrupção, profanadora dos deveres
políticos e direitos democráticos, perversora da honestidade e do convívio
social, aliciadora do bem público e demolidora dos preceitos civis!
Mas o
abstratismo que impera nos recentes protestos contra a corrupção é um mal a
mais à sociedade brasileira, divorciada, pelos segredos, da “sociedade política”. Quem é essa atroz e infame corrupção, essa vil depreciadora de
sabe-se lá que moral política? Ao que tudo indica, a nossa corrupção traja
terno, é vulgarmente conhecida por “político” e desvia verbas.
Mas, por
essa descrição, são abundantes os suspeitos! Devo ficar alerta a todo
engravatado que se diga político? Ou devo empenhar minha anêmica memória
política a desvendar os traços faciais e a graça do engravatado que elegi
parlamentar? Oh, dilema!
A indignação
é o primeiro passo, caro leitor eleitor, rumo a mudanças profundas. Foi assim
em toda a história da humanidade. Assim a democracia tomou contornos ante a
opressão aristocrática na Grécia clássica. Assim a burguesia enterrou o poder
espiritual e fez valer seus interesses no princípio do capitalismo comercial.
Assim muitos foram presos, torturados e assassinados no Brasil, antes da
conquista de um regime democrático através do voto direto. Quase ontem.
No entanto,
a indignação sem culpa, sem a responsabilidade política, é cega. E é a cegueira
que guia boa parte dos indignados que excomungam a corrupção nas ruas do Brasil.
Há protesto lúcido em meio a esse carnaval, como aquele que exige o fim do voto
secreto no Congresso. No entanto, dedos precisam ser apontados, há algumas
faces bem conhecidas pra essa seva corrupção.
À guisa de
provocação, você sabe o que fazem os parlamentares nos quais você depositou seu
voto, esse soberano direito civil?
É bom saber.
Pois, no fim, você poderá estar protestando contra o engravatado político no
qual você votou e, por tabela, condenando sua própria corrupção.
terça-feira, 11 de outubro de 2011
Comercial da Caixa, a cor do Machado Assis e o Politicamente Incorreto
Negros foram mercadoria por milênios. Os direitos civis não possuem dois séculos. E já tem gente reclamando de exageros politicamente corretos. É como se as minorias da população estivessem abusando do direito de pedir por respeito. Tanto que entrou para o vasto fundo cultural do senso comum a ideia de que o mundo sofre com uma "ditadura das minorias" e que ser politicamente incorreto é defender a liberdade de expressão.
Nessas, a Caixa fez um comercial com um Machado de Assis branco. Reclamou-se, bateu-se de todo lado na produção. Refizeram-no. No link, alguns comentários mostram uma galera achando que é excesso de "politicamente correto" refazerem o comercial. Veja a nova edição:
Os politicamente incorretos consideram bobagem, que a discussão é inútil, um exagero. Agora imagine Clarice Lispector, a quem cogitaram Meryl Streep para interpretar, vivida por uma atriz de pele negra. Imagine crítica e repercussão. Não é bobagem.
Madonna e Mary Lambert sabiam muito bem desse potencial polêmico quando contrataram um ator negro para representar Jesus (que seria loiro, de olhos azuis e cabelos lisos e ondulados, a despeito de sua naturalidade geográfica). Ainda que há 22 anos atrás e envolvendo fatores religiosos, a polêmica gerada pelo videoclipe - muito mais interessante que as polêmicas causadas por vestidos de cantoras, diga-se - revelam que não se trata de uma simples questão de "politicamente correto".
Quantos não são os vloggers e apresentadores a menosprezar essa e tantas outras causas por partirem de um PONTO DE VISTA "hetero-branco-rico-cristão"? O curioso é que a primeira vez que um humorista é de fato politicamente incorreto, desta vez com uma filha de cantor, esposa de gente poderosa, a conversa mole da liberdade de expressão cai por terra.
Evidentemente, o humorista é mais um mané que acha que há um excesso de pudor, muitos limites para a lirve-expressão. Justo por causa de uma frase na qual não foi preconceituoso. Estúpido, inadequado, entre outros qualificadores, mas ele não manifestou um preconceito. Quando foi, assim como Boris Casoy o fez ao falar de garis, não teve grandes problemas. A Band defende esse tipo de "liberdade de expressão".
Que haja. Na hora em que todos forem respeitados da mesma forma e/ou houver piadas sobre brancos, ricos, cristãos e heterossexuais da mesma forma que há com negros, pobres, gays e (dis)crentes em outras formas de sagrado, o politicamente correto não vai ser mais necessário.
Nessas, a Caixa fez um comercial com um Machado de Assis branco. Reclamou-se, bateu-se de todo lado na produção. Refizeram-no. No link, alguns comentários mostram uma galera achando que é excesso de "politicamente correto" refazerem o comercial. Veja a nova edição:
Os politicamente incorretos consideram bobagem, que a discussão é inútil, um exagero. Agora imagine Clarice Lispector, a quem cogitaram Meryl Streep para interpretar, vivida por uma atriz de pele negra. Imagine crítica e repercussão. Não é bobagem.
Madonna e Mary Lambert sabiam muito bem desse potencial polêmico quando contrataram um ator negro para representar Jesus (que seria loiro, de olhos azuis e cabelos lisos e ondulados, a despeito de sua naturalidade geográfica). Ainda que há 22 anos atrás e envolvendo fatores religiosos, a polêmica gerada pelo videoclipe - muito mais interessante que as polêmicas causadas por vestidos de cantoras, diga-se - revelam que não se trata de uma simples questão de "politicamente correto".
Quantos não são os vloggers e apresentadores a menosprezar essa e tantas outras causas por partirem de um PONTO DE VISTA "hetero-branco-rico-cristão"? O curioso é que a primeira vez que um humorista é de fato politicamente incorreto, desta vez com uma filha de cantor, esposa de gente poderosa, a conversa mole da liberdade de expressão cai por terra.
Evidentemente, o humorista é mais um mané que acha que há um excesso de pudor, muitos limites para a lirve-expressão. Justo por causa de uma frase na qual não foi preconceituoso. Estúpido, inadequado, entre outros qualificadores, mas ele não manifestou um preconceito. Quando foi, assim como Boris Casoy o fez ao falar de garis, não teve grandes problemas. A Band defende esse tipo de "liberdade de expressão".
Que haja. Na hora em que todos forem respeitados da mesma forma e/ou houver piadas sobre brancos, ricos, cristãos e heterossexuais da mesma forma que há com negros, pobres, gays e (dis)crentes em outras formas de sagrado, o politicamente correto não vai ser mais necessário.
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