As empregadas domésticas do fantástico mundo da Globo são popstars. Mas na prática a teoria é outra. |
A boa e
velha ode ao trabalho servil, sofrido, mal pago, sem sentido e sem futuro. Não
é de hoje que a Rede Globo exalta e decora fantasiosamente o sofrimento diário
e de toda vida do assalariado, ou assalariete.
Em novela
recente, uma dona de casa enfrenta preconceito do filho, dificuldades
financeiras, trabalho exaustivo e toda espécie de fado de qualquer outro
trabalhador. E, como também calha diariamente a qualquer outro trabalhador,
ganha na loteria.
É chique ser
assalariete, dá até na novela. Você que tem empregada doméstica na sua
residência seguramente já parou para refletir sobre o trabalho da moça que lava
seu vestuário íntimo. Se não, tente, pelo bem da sua consciência. As profissionais reais vivem uma rotina sem brilho.
Arte que
institui e adorna o abismo social que predomina no país deve ser contestada. As
atrizes Taís Araújo, Isabelle Drummond e Leandra Leal podem ser chamadas de
“Cheias de Charme” sem muito receio da névoa da imprecisão.
Mas a
questão é se vale a pena interpretar empregadas que viram estrelas, ou se mesmo
podem representar as empregadas domésticas espalhadas pelo Brasil.
Não que
estejam moralmente impedidas de interpretar. É da natureza de profissionais
cênicos encararem os mais contrastantes papéis. As mais diversas realidades.
Além de todas as três carregarem experiência e reconhecimento, são grandes
profissionais.
Mas
transmitir, com luxos excêntricos, o júbilo de enfrentar desdém, exploração, transporte ruim e rotina desgastante, foge ao bom
senso e mesmo à realidade que desejam representar.
As gatas
borralheiras contemporâneas pintam conquistas na irrealidade, no imaginário. Ao
mesmo tempo, a realidade palpável da emissora que faz o circo é a de atalhar
sucessos das pessoas representadas em suas novelas. Fazer sonhar é mais
rentável que realizar sonhos. É o sistema.
É tradição do
“padrão Globo de qualidade” pintar, com as melhores cores, as tragédias
nacionais. Foi assim durante o Regime Militar com manipulação de notícias e
imagens; é assim com o jornalismo partidário e encobridor da corrupção
envolvendo parceiros da emissora; e naturalmente, pelo mesmo caminho, segue o
entretenimento de antolhos que conforma o assalariete à sua devida condição,
tão promissora na ficção.
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