terça-feira, 10 de julho de 2012

Bolsa sim, “emprego” não!


   
Foto: Felipe Gesteira
Desde a instituição de programas sociais como o Bolsa Família pelo governo federal, a imaculada ala dos corretos chia com a concessão dos benefícios: “bolsa-esmola!” bradam os infecundos críticos de qualquer coisa; “Só querem bolsa, trabalho nada!” impugnam os incorruptos advogados da moral classemedista.

No entanto, mesmo estufando o peito com ares de exegetas político-sociais, de nada sabem esses presunçosos desinformados das coisas palpáveis, do alto de seus apartamentos, carros, celulares e Facebooks.

Criados em ambientes confortáveis, tendo televisor toda vida, computadores, educação e lazer à altura das mimadas mãos, jamais sequer imaginaram os perrengues por que passam romarias de despojados que nascem, vivem e morrem pobres, há séculos, sobre o chão brasileiro.

Não é a intenção moralizar. Mas não são válidos, muito menos éticos, comentários cotidianos boiando na superficialidade do conhecer humano. A tendência dos que são contrários aos programas de transferência de renda é a de repetir um discurso desbaratado, carregado de moralismo e sem pé na realidade. Isso porque julgam o caboclo pobre dos rincões nacionais à luz de seus quartos aconchegantes e bem decorados.

Exemplo semelhante veio das doutas mãos de Luiz Felipe Pondé, ao criticar os que analisam a realidade dos indivíduos tendo o social como pano de fundo. Sem entrar em pormenores, o venerado filósofo do horário nobre considera sensato supor a realidade de indivíduos socialmente oprimidos do alto de seu confortável habitat nos Jardins, Higienópolis ou arredor análogo.

É fácil, e cômodo, descortinar o chavão de que fulano vai se acomodar com o dinheiro, não vai querer trabalhar e, por grosso silogismo, vai viver à custa do Estado. Esse raciocínio é inocente, ou farto de uma deletéria lógica “arbeit macht frei”.

Inocente, pois boia na onda e repete, papagueia simplesmente. Ecoam por essas vazias mentes também urros de “político é ladrão”, “Fora Sarney!” e, mais recentemente, um obsessivo “#vetaDilma”. Como são, por que são e quais as intenções de ser desses programas de transferência de renda são enigmas abstrusos e insolúveis para quem está mais empenhado com seus próprios apetites.

Quanto à honra do “trabalho liberta”, não há aforismo mais anacrônico. E, como os da inocência, os que agitam essa bandeira não enraízam suas convicções. São aqueles que cobram corte de bolsas porque o “pobre acostuma”, e apontam o dedo condenando o cidadão ao batente. “Vai trabalhar, vagabundo!”. Mas são também esses indefectíveis críticos que resmungam de segunda-feira, do trânsito e do fatal e maldito final do fim-de-semana.

Não há argumentos que sustentem, sob o ponto de vista da saúde do ser humano, o emprego como algo que liberte, engrandeça ou garanta uma vida saudável para um e para todos.

Os que defendem trabalho assalariado para os beneficiados por programas sociais, além de carregarem uma moral do lucro, para regozijo daqueles que verdadeiramente lucram, ainda passam longe da compreensão do ser humano como autor de sua própria vida.

Essa repreensão sequer reflete sobre o sentido do trabalho. E, mesmo reclamando do patrão e das outras cruzes de suas próprias atividades remuneradas, essas críticas almas repetem incessantemente o adágio da moral “vai trabalhar!”.

São falsas muitas das condenações ao Bolsa Família. Não é o programa ideal. Mas num país (leia-se cidadãos, governos e setor privado) que cultivou, e ainda cultiva a desigualdade econômica, política, social e cultural, essas medidas são urgentes.

Urgentes para que muitos brasileiros tenham o que comer, como se vestir, como comprar remédios, tenham condições de estudar. São medidas urgentes para se criar condições nas quais os beneficiados possam crescer. Mas só crescerão de fato quando a moral do emprego assalariado der lugar ao movimento pela cidadania, pelo trabalho coletivo, cooperativo, social e com sentido para o cidadão, para o povo e para o Brasil.

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