O país tem
pouco mais de 403 mil habitantes em cerca de 103 mil km². Independente há cento e poucos anos, a república é jovem, 68 anos. Com 99%
de alfabetização e mortalidade infantil não passando de 2,9 crianças por mil
nascidas, esse pedaço de terra cercado de água está consideravelmente distante
do continente europeu, física e democraticamente.
Com a ajuda do Mapa de Caracteres e do Google Translator, acima está algo como: "Parem de oprimir o povo no país" |
Enquanto a oligarquia assola a zona do euro, a Islândia se sobressai pelos atos de
soberania do povo. Um pedaço de democracia cercado pela austeridade à “Merkozy”
e pela recessão. O referendo grego do Ágora ou Nunca seria um bom exemplo às
cúpulas financeiras que tentam controlar a crise as custas da população. Seria,
não fosse a adaga do FMI a cutucar os anseios democráticos helênicos. O exemplo não saiu de Atenas, não obstante a música.
Com a
eclosão da crise financeira de 2008, ouvimos boatos de nacionalização dos
bancos na Europa e mesmo nos EUA, para agonia dos liberalistas. No entanto só
aquela pequena ilha a noroeste do velho mundo promoveu o feito. Os três bancos
privados islandeses, Glitnir, Kaupthing e Landsbanki foram nacionalizados em
outubro de 2008. Mesmo assim a Islândia sofreu os duros golpes da recessão.
A coroa
islandesa despencou, a Bolsa de Reykjavik sofreu queda de 76% e suspendeu suas
atividades e a falência da ilha fora decretada. À época, 2008, foi o país que
mais sofreu com a crise no mundo.
No início de 2009 inicia-se o protesto. O povo islandês começa a se concentrar em frente ao
Parlamento (Althingi) e ordena a renúncia de todo o governo conservador,
comandado por Geir Haarde.
Foram convocadas eleições antecipadas e, em abril do mesmo ano, os islandeses deram a
vitória à coligação formada pelo Movimento Esquerda Verde e pela Aliança
Social-Democrata, elegendo Jóhanna Siguðardóttir como sua primeira ministra. Para salientar
o caráter exemplar da mudança de governo, Jóhanna é a primeira mulher a ocupar
a liderança do parlamento islandês, além de ser homossexual assumida.
Um paraíso do neoliberalismo sob o comando de Haarde, a Islândia costumava abrir os braços ao
capital financeiro estrangeiro, principalmente ao britânico e ao holandês. Com a
quebra dos bancos islandeses, sobretudo o maior, Landsbanki, os governos da
Grã-Bretanha e da Holanda abriram ação para a indenização de seus clientes, a
conta tendo que ser paga pela Islândia.
A dívida ficou estimada em 3,5 bilhões de euros e recairia sobre o povo islandês, pois a
venda dos bens do Landsbanki não cobriria a tal dívida em sua totalidade, e a
responsabilidade pelos débitos do banco era do governo que o nacionalizou. O Parlamento aprovou uma lei que cobrava de
cada cidadão islandês o ressarcimento da dívida, assim, dividida.
Novamente os
islandeses tomaram as ruas em 2010 e exigiram referendo para a tal lei. Em
janeiro de 2010 o presidente, Ólafur Grímsson, se recusa a sancionar a lei e
declara que será feita a consulta popular.
Ágora. Em março, 93% dos islandeses votam pelo não pagamento da dívida. Enquanto Grécia, Irlanda
e Espanha são exemplos de países que sofrem com as exigências do FMI para
pacotes de austeridade e recusa de referendos por parte dos governos, na
pequena ilha ártica o povo é quem decide os rumos da nação.
Em seguida, os
responsáveis pela crise dos bancos privados são investigados e responsabilizados juridicamente pela crise financeira que quebrou o país. São iniciadas investigações e detenções com a
pressão do povo sob a coligação do novo governo. Os crimes financeiros
investigados e esclarecidos na Islândia permanecem um mistério no resto do
mundo. Lá há mobilização.
A pressão popular
foi longe, uma assembleia constituinte foi convocada, com a eleição de 25
cidadãos sem filiação partidária: representantes sindicais, estudantes,
agricultores, jornalistas, dentre outros. A nova constituição é inspirada na
carta magna dinamarquesa, tendo inclusive recebido sugestões da população via
internet.
Há escassa
cobertura internacional, justificada, uma vez que um povo tomando as rédeas de
sua própria nação desagrada aos grandes veículos de comunicação e a seus
protegidos.
No entanto, são boas as previsões de crescimento da Islândia em 2012. E o exemplo dado pelo
povo islandês está sendo divulgado na Espanha, por exemplo, e necessita ganhar
repercussão. Para além dos usos indevidos da democracia no resto do mundo, ali levaram ao pé da letra o sentido da palavra.
Mesmo que a crise tenha passado como marola pelo Brasil, ainda fica o exemplo de mobilização séria,
responsável e direta. Meros protestos soltos em redes sociais, sem o devido
direcionamento, não chegarão longe. Logo, mirem-se no exemplo.
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