Em São Paulo
as coisas adequadas acontecem em doses. Goles de cidadania num mar de barbárie.
Chega a ser piada de mau gosto celebrar as episódicas viradas que tomam todo um
dia de fim de semana, cada uma. Otávio Augusto, imperador romano, ao menos dava
o panis com o circenses. Em São Paulo fica só o circo, porque a galinhada é pra
poucos.
Crianças fumam crack no bairro da Luz, um dos palcos de eventos como a Virada Cultural. |
A Virada
Cultural seria uma política perfeita, fosse a cidade amistosa com artistas e o
entretenimento mais acessível ao público. Em outras partes do mundo,
funcionaria como estímulo à arte e cultura. Mas onde a divulgação de material de
artistas de rua já foi proibida pela alta cúpula municipal, a cultura fecha as
portas para muitos.
Contando
ainda com a dificuldade de acesso a teatros, museus et similia. Com políticas que evidenciam cada vez mais um potencial
de apartheid na Pauliceia, as opções
suburbanas de cultura se reduzem, na maioria das vezes, aos cinemas das grandes
redes, e olhe lá. A cultura é concentrada no centro, onde poucos têm realmente
acesso. O transporte público trafega em horários limitantes, além de taxis,
estacionamentos e ingressos que restringem a difusão da cultura por outras
partes da cidade.
O negócio
pra maioria é esperar a próxima dose da virada cultural, com ou sem a afamada
galinhada. Ou atentemos a candidatos que têm propostas reais para educação e
cultura para toda a cidade neste ano.
Os esportes
também ganham seus quinhões de atenção. A Virada Esportiva tem o propósito de
realizar atividades pela cidade. Temos arenas no Anhangabaú, onde normalmente
encontramos poças de urina, trabalhadores apressados e andarilhos numa cidade
sem alma. Além de outros pontos em que o esporte é estimulado, anualmente.
Mas nas
escolas públicas pouco se produz de incentivo ao esporte. O sistema CEU
implantado em outra gestão tem o intuito de levar à periferia um constante
trabalho de estímulo a atividades esportivas, artísticas e culturais, paralelas
à educação formal. No entanto é pouco. Com poucos parques e áreas verdes e
ludibriados sonhos de ciclovias, as opções são limitadas, sobretudo, a clubes
privados.
Continuemos
tendo como sinônimo de esporte a torcida pelo time, no sofá. Ou olhemos e
escolhemos com atenção iniciativas que já deram sucesso e podem trazer novo
fôlego esportivo à cidade, sem segregação, a partir deste ano.
Por fim, vem
aí a Virada Sustentável, de iniciativa privada, com exposições, oficinas e
demais atividades voltadas ao meio ambiente, direitos humanos, biodiversidade e
mudanças climáticas.
Ao menos uma
vez por ano, se a moda pegar. Pois pra uma cidade que assiste à gentrificação e
caça a dependentes químicos, a preferência da prefeitura pelo transporte
privado ao público, a ausência quase completa de coleta seletiva, que também
sofre com o reduzido número de áreas verdes, com o deslocamento da
criminalidade para a periferia, níveis de poluição e trânsito alarmantes, dentre
outros retrocessos sociais, não cabe, para essa cidade, o selo sustentável.
Assim, por
aqui as boas iniciativas são episódicas e carregadas de propaganda: circo. A
política pública paulistana é virada, só de viradas. No resto do ano a cultura
é cara, o esporte se reduz à academias e a sustentabilidade passa longe da selva
urbana. Já passou da hora de cultivar outra virada, também sustentável, a
partir deste ano.