Em novembro
de 2011 foi publicado no Brasil o livro “A Privataria Tucana” do jornalista
Amaury Ribeiro Jr. Pouco divulgado pela grande imprensa nacional, a publicação
traz minúcias do esquema de privatização nas altas do governo FHC, com
denúncias, mas também com o que algumas vezes tem faltado ao famigerado
“julgamento do século”: provas. Boa parte do livro de Amaury Ribeiro Jr. é
composta por documentos, não contrabandeados, mas facilmente disponíveis em juntas
comerciais, envolvendo peixes grandes do PSDB e toda a trama de venda de
estatais e enriquecimento de alguns poucos indivíduos.
Hoje, ao
final de 2012, pululam notícias sobre a acusação do publicitário Marcos
Valério, dito operador do que fora conhecido como “Mensalão”, contra o
ex-presidente Lula. O depoimento de Valério ocorreu em setembro, mas foi vazado
agora. O publicitário está condenado a 40 anos de prisão por uma série de
crimes, seus depoimentos se mostraram contraditórios e a delação premiada se
apresenta como o consolo para Valério. Razões para não crer.
Em todo
caso, não escrevo aqui para defender o PT. Mas para tentar atrair a atenção
política para um debate menos fanático e mais produtivo. Tenho críticas ao
partido, dentre elas ao esquema chamado de “Mensalão”, mas não consigo me
limitar ao alarde de suspeitas porque procuro não me amarrar a partidarismos ou
antipartidarismos.
Criado por
intelectuais, religiosos e sindicalistas, para calar a birra de Marcelo Tas
quanto ao “dos trabalhadores”, o PT juntou, em seu início, diversas ideias de
transformação de um país atado pela ditadura militar. Ainda conserva boa parte
desses ideais iniciais em grupos dentro do partido, mas desde que conquistou o
executivo nacional com Lula, se enredou pela lama do fisiologismo herdado do
católico império português.
Também não é
a intenção desenhar a história do partido desde sua fundação em 1980. Quero
sim, talvez, proporcionar aos antipetistas de plantão argumentos mais sólidos e
menos ridículos do que os atuais, embebidos em moralismo barato e sem nenhum
propósito positivo.
A começar
pelas alianças. Nas três primeiras tentativas de Lula ao Planalto depois da
redemocratização, 1989, 1994 e 1998, o PT se aliou exclusivamente a partidos de
esquerda. Em 2002 recebeu apoio de legendas alheias aos seus tradicionais
ideais, como o conservador e centro-direitista PL, conquistando a eleição
presidencial. A partir daí precisou lotear cargos comissionados aos partidos da
base aliada, o que se repete na prefeitura de São Paulo agora.
Há aí um
problema da estrutura política nacional. Um executivo não governa se não tem
maioria no legislativo e, por mais frutíferas e necessárias que sejam as suas
propostas, ainda é no esquema de escambo que se consegue apoio. Mas o antipetismo
não consegue condenar essas alianças, pois vota em coligações mais sombrias. O
PT deveria se sustentar, em cada eleição, no apoio popular que tem, não nas
tenebrosas alianças que aceita.
O campo é
outro lugar do qual emanam condenações ao governo do PT. Em seu início, o
partido tinha por norte a reforma agrária, apoio ao pequeno camponês e à
agricultura familiar. Há programas de assistência a essa população, como o
PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), mas ainda
é o favorecimento às grandes empresas, muitas de capital estrangeiro, que
predomina.
Com isso,
para o crescimento da produção agropecuária, ainda são os poucos e grandes que
lucram. Há tragédias sociais como a morte de camponeses e índios por jagunços
pagos pelo grande latifúndio, a perda de terras daquela população pela expansão do agronegócio, exploração do trabalho rural e ainda o trabalho escravo. Assim
como severos danos ambientais por pouco investimento em sustentabilidade,
assoreamento de rios, desmatamento, contaminação por agrotóxicos, transgênicos e
um festival de agressões de grandes empresas não fiscalizadas.
É fraca a fiscalização, fracos são os movimentos estatais de reforma e é forte o lobby de ruralistas. O pequeno negócio rural e a agricultura familiar empregam 80% da
mão de obra do campo e 70% do que é consumido pelo brasileiro vem desses tipos
de produção. Mas o PT continua refém da mídia no campo, sem transformações
efetivas.
A Educação
também não tem recebido a atenção desejada pelo governo do PT. Apesar dos
avanços como acesso e expansão das universidades federais, certos desvios de
percurso merecem crítica. Como a difusão de universidades particulares,
empresariais e comerciantes de ensino que formam mal seus profissionais. Não
existe educação bem feita com lógica empresarial, pois se cai no racionamento
educacional, no qual o lucro precisa justificar o investimento. Desse modo, infla-se
o mercado de trabalho com técnicos em profissões meramente lucrativas, sem
propósitos sociais e com cursos promocionais e formações efêmeras.
Ainda outro
lamentável ponto da política educacional do governo Lula foi o do investimento.
Lula manteve os vetos de FHC aos artigos do PNE que implicavam em investimentos
na Educação. Só hoje o governo do PT, não tão amplamente apoiado por sua
heterogênea base, vota 10% do PIB para o PNE. Mas a expansão das federais e a
valorização dos professores poderiam ter sido muito mais bem feitas se houvesse
compromisso inicial com a Educação. Resultado disso são as obras inacabadas de
algumas universidades, assim como os ainda defasados reajustes salariais e
planos de carreira de docentes, mesmo depois da greve desse ano, desestimulando
a carreira acadêmica.
Sinceramente
espero que a posição de credor do FMI seja de alguma valia para o Brasil. Mas
não creio que o crescimento econômico esteja de mãos dadas ao crescimento
social como pode estar. E nessa toada a verdadeira oposição ao governo cobra
ações mais efetivas e apresenta propostas necessárias. Já a oposição de vitrine
se enfraquece, pois está limitada aos pedidos de investigação sempre que uma
suspeita surge.
São outras
minhas condenações ao governo petista. Das relações com empreiteiras em obras
da Copa e em financiamentos eleitorais aos escândalos de corrupção que o
partido, hoje demasiado inflado, enfrenta. Mas a prolixidade me desencoraja a
ir mais longe, por hora.
Cabe, por
fim, lembrar que a militância petista, quando cega, releva os malfeitos de seu
partido e aceita inconteste os podres com os quais o PT governa. Mas a
militância antipetista não se fundamenta, não elabora argumentos sedutores e
papagueia a perseguição infértil da mídia conservadora, de maneira igualmente
fanática e acéfala.
É preciso
fugir tanto de um quanto do outro. Cidadania não se aluga, se constrói.