Lógica defendida por aqueles que rechaçam os vazamentos do Wikileaks. Lógica que escancara o fracasso vergonhoso da representação democrática, já que é impossível que a opinião de um povo seja representada em um assunto que ele desconheça seus pontos cruciais.
Tanto reclama-se da apropriação do dinheiro que financia o Estado, mas a verdade também é um bem público. Quando um político resolve seus problemas a portas fechadas, a democracia fracassa sem nem mesmo ter a chance de acontecer. Não há como se representar a quem se aliena. Isso não é diferente de patrimonialismo, uma apropriação privada de informação pública.
(E há quem defenda a legalização da profissão de lobista, que consiste em convencer um político, geralmente por meio de argumento$ sólido$ e troca de favores pessoais, a aprovar determinada medida que beneficiará grupos interessados. Assim, o político nega a participação política a seu eleitorado para representar interesses privados. É a apropriação da decisão do Estado, é roubar sua voz ao invés do seu dinheiro).
Uma manobra dessas foi supostamente necessária para garantir a Comissão da Verdade. Numa "teleconferência" realizada em um banheiro. É utópico achar que hoje seja possível governar sem sigilo, mas quando justamente os segredos de Estado estão sendo postos á prova, transparência deveria ser uma exigência mais rígida.
É doloroso pensar que, todo o sacrifício que inclui tamanha "relativização" da ideia de representatividade, além das flexibilizações exigidas pelo DEM (Bisneto dos líderes da ditadura, pra quem não sabe: ARENA, PDS, PFL, DEM), que quer uma comissão com pessoas com condições de agir com imparcialidade - e indica o milico Nelson Jobim para participar do grupo (!?) - é só pra aprovar um cala-boca.
O STF não quis bancar o salvador da pátria e a Lei de Anistia foi mantida. Políticos criminosos da ditadura ainda estão no poder. A mídia ainda dá espaço a apresentadores ex-para-militares e colunistas que debocham das máculas do nosso passado recente. Em contraponto, teremos uma comissão da verdade para apurar Duas décadas de ditadura em ...dois anos.
Parece bastante difícil de conseguir alguma coisa, né? Mas ainda é útil. Os militares podem não pagar por seus crimes, mas responderem por suas atrocidades, pelo menos, já seria alguma coisa. Todavia, o resultado dos trabalhos pode nem mesmo vir a público, depende do que considerar a comissão. Ou seja, toda aquela tensão pra, possivelmente, acabar tudo como estava.
O Estado deu dois anos pra comissão e eu acho pouco, mas na verdade pode ser ainda menos. Justiça que tarda, falha. E falha mais gravemente quanto mais tardar. Romeu Tuma já foi. Maluf, Sarney e Ustra ainda estão aqui, mas por quanto tempo? Que esses trabalhos andem logo pra conseguir fazer o máximo que se lhes permite: apontar o dedo na cara de quem cometeu abusos contra os direitos dos cidadãos. Se demorar, não vai servir nem pra isso.