sexta-feira, 22 de abril de 2011

abuso do repórter

Maurício Stycer se rebelou contra a categoria. A revolta se deu ao observar os fotógrafos e repórteres que cobriram a tragédia do Realengo e a volta às aulas do colégio onde se deu a série de homicídios que flodou redes sociais e noticiários.

Os profissionais que vão garimpar a notícia são passíveis de muitas críticas, mas tentar humanizar a profissão através deles é tão infantil quanto exigir o desarmamento para evitar homicídios em massa: até são causas nobres e válidas, mas o problema é uma cárie bem mais profunda no nosso sorriso amarelo.

É fácil chamar os repórteres e fotógrafos de abutres. Mas, se não chegarem com uma manchete e boas imagens dalí, os editores os enforcam. Os editores são os abutres.

Fácil chamar os editores de abutres. Se os concorrentes os furarem, os donos das empresas de comunicação os enforcam. Eles são os Abutres.

Se o publisher da emissora X não quiser cobrir o caso, o publisher Y vai cobrir e ficar com os anunciantes. Eles são os Abutres.

Os anunciantes ficam com a emissora que cobre de forma mais abusiva este tipo de caso, por que há uma demanda popular. A emissora que atender melhor essa demanda terá mais espectadores, o que satisfaz os anunciantes, que farão comerciais sobre desenvolvimento sustentável e paz no mundo.

E aí? Vamos chamar os espectadores de abutres? São a ponta frágil dessa conta, mas não são inocentes. Há demandas populares que são questionáveis, mas quem pode dizer-se acima do povo para não atendê-las ou mesmo censurar quem as atenda?

O jornalismo deve atender essas demandas sem transformar estes casos em malhação de judas, intensificando o coro da massa, legítimo por querer justiça quanto ao descaso com que o Estado lhe atende, mas que considero equivocado na forma como busca essa justiça.

Estimular a crítica à massa é tarefa árdua, e os manuais de redação, em busca da suposta objetividade jornalística, praticamente suprime essa possibilidade. Tudo que resta é a alimentação do desejo de consumir tragédias e carnificina pelas mais diversas mídias.

E o debate, ainda que atenda esse desejo, não o faz de forma automática, fast-fúdica. O problema vai ser superar quem venda a informação sem esse debate. Mas aí, o espectador é quem deverá escolher entre alimentar seu ódio irracional às atrocidades igualmente irracionais que nos acometem, ou estimular a crítica às autoridades competentes cuja função é justamente trabalhar para que isso não aconteça.

Se escolherem a primeira opção, não reclamem da falta de humanidade dos repórteres e fotógrafos: seguramente, eles não gostariam de estar ali.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Por quê Sim ao Tiririca na Câmara


O Haja vai dar uma de O biscoito Fino e a Massa. Não por atingir a qualidade das postagens do mestre Idelber Avelar, mas por abrir espaço para vozes ilustres de fora do blog. O Psicólogo Yuri Ongaro, grande amigo meu, traz alguns caracteres muito interessantes sobre crítica de mídia e sociedade, e a xenófoba mania destas de perseguir quem não se enquadra no padrão estético da Avenida Paulista.

Recomendação de Thiago Teixeira
A esmagadora maioria dos meus amigos recebeu com surpresa minha manifestação de agrado à eleição do palhaço Tiririca para a Câmara Federal nas eleições de 2010. Aposto que a mesma surpresa atinja quem se conforma com o título deste texto sem se dar ao exausto trabalho da leitura, tão desprestigiada em nossos tempos. Inicialmente, para já facilitar os próximos passos, não votei no cidadão Francisco Everardo, muito menos no famigerado Tiririca, no entanto vejo com bons olhos sua presença na casa, assim como seus “escândalos” já destacados pela grande
mídia. Afirmo, com toda a convicção, que se trata daquilo que muitos chamam de “um mal necessário”.

Levanto já indagações: os mais de 1 milhão de eleitores votaram em alguém que conhecem, não era essa uma das críticas que a mídia sempre colocou em pauta para justificar, sob que obscuros pretextos, que o brasileiro vota mal? E o que há por trás do recorde do Tiririca, um protesto consciente ou um vivo sinal de que a política anda tão distante das necessidades do povo, que esse já lava suas mãos? E tal tipo de descompostura do eleitorado é patrocinado pela mídia, afinal soubemos muito mais do Tiririca do que de qualquer outro parlamentar eleito. Será que porque ele é um palhaço e os demais são engenheiros, advogados, militares? A atenção concentrada na atividade legislativa do deputado Francisco Everardo é sem precedentes na história da cobertura política nacional: “Tiririca votou errado”, “Palhaço Tiririca gasta dinheiro público em resort”, “Tiririca contrata humoristas como secretários parlamentares” e por aí vai, afinal a palavra “Tiririca” rende assuntos e acessos. As notícias arrebatam um sem número de cliques porque tratam de um palhaço, e a classe média pseudo-politizada encontra o espaço pra desfraldar seu extenso e vazio discurso de “absurdo!”, “infâmia!”, “puta sacanagem!” et similia.

Ora, a que se prestam essas notícias dos portais de internet a apontar seus suspeitos dedos ao cidadão Francisco Everardo? A uma elucidação política do povo sobre o que se passa nos legislativos pela república? Ou se presta à troça do deputado Tiririca, afinal ele é um palhaço? E aqui há outro ponto interessante: Tiririca tem sido tratado somente como um palhaço por pessoas que se manifestam contrárias ao preconceito, seja esse qual for, não é curioso? Mas, um palhaço? Não seria melhor mais um político de carreira, como um Maluf menos badalado, que gastará nos mesmos resorts, contratará os mesmos funcionários suspeitos, mas que não tenha os holofotes do picadeiro midiático que tem Francisco Everardo? A casa possui 513 deputados, não seria justo e politicamente prudente saber o que fazem ou não fazem os demais 512 parlamentares com seus PLs, seus discursos e com o dinheiro público? Talvez não, afinal qual é a graça dos empresários, dos professores, dos engenheiros ou dos economistas eleitos? Nenhum deles é palhaço. Em um país em que tanto se discute e se combate o preconceito, muitos desses são velados ou autorizados pela maioria. É saudável refletir sobre o menosprezo ao outro que muitos de nós carregamos em nossas sombras.

Ainda nas águas doentias do preconceito, recentemente se tornou público o grave caso do deputado Jair Bolsonaro. O que muitos não sabem, é que o militar acumula legislaturas desde 1991. Em outros termos: esse cidadão, que deixou manifestas suas intolerâncias política, sexual e racial em rede nacional, nos governa há 20 anos. Contudo, foi preciso que um programa de alta audiência facilitasse o escape de todo esse ranço discriminatório para que soubéssemos que tal militar, filho da “página infeliz da nossa história”, elabora leis e ganha pesado soldo por isso. O que soubemos do parlamentar Bolsonaro nas últimas duas décadas? Incomodou-nos? Não,
afinal era privado o que é de interesse público e ele não é um palhaço, não como Tiririca. E os demais 511 deputados, conhecemos? Soubemos de dois, já é um avanço.

Havemos de acompanhar a legislatura de Francisco Everardo pelas manchetes enviesadas da grande mídia, em clara demonstração de que os principais veículos de comunicação são conformados ou tendenciosos. Conformados porque raras vezes a atividade parlamentar é alvo de análises de grandes jornais, e muitos devem ter seus rabos presos com um ou outro empresário, advogado, os supracitados profissionais eleitos, enfim. Tendenciosos porque muitos levantam suas empoeiradas bandeiras ideológicas em nome da guerra política, de maneira sutil como cabe ao jornalismo “imparcial”, mantendo os cidadãos em segundo plano. “Tiririca ainda não apresentou nenhum projeto de lei”, “O palhaço Tiririca ainda não discursou no plenário.”, quem apresentou, quem discursou? Quantos noticiaram que Tiririca gastou apenas R$ 42,03 de sua cota parlamentar no mês de março? Quantos tornaram público que, já em fevereiro, o deputado Francisco Everardo iniciou a recriação da Frente Parlamentar em Defesa da Cultura Popular e criou um projeto de integração cultural com outro deputado tocantinense? São notícias que não alimentam o deboche pelo “deputado-palhaço”, não rendem público ao circo que se tornou a imprensa.

Por fim, quero justificar o porquê do “mal necessário” referido no primeiro parágrafo. Através dos motejos pouco informativos de grandes jornais acerca das “palhaçadas” do deputado Tiririca é que podemos ter um panorama do funcionamento da câmara dos deputados, que pode tranquilamente ser base de compreensão dos demais legislativos pelo país. As cifras gastas com resorts, as viagens de avião, as reformas de escritório e demais abusos financeiros são correntes nos parlamentos Brasil afora. Através dos holofotes no palhaço, vamos saber que muitos
deputados não propõem projetos de lei e outros se preocupam meramente com jogos político partidários em detrimento do interesse público, além daqueles que votam conforme a maioria, sem nem tomar conhecimento dos assuntos em pauta no congresso. E mesmo a falha no sistema eleitoral, tornada pública pela eleição de deputados de carona nos mais de um milhão de votos de Francisco Everardo, falha combatida pela “Lei Tiririca” na vindoura reforma política, é mais um sintoma (ou sinal?) de que há algo de podre na república do Brasil.

E a gente? Ah, a gente se preocupa..."ma non troppo", fala mal, xinga, menospreza, debocha do palhaço, enfrenta inflação, pega trânsito, paga imposto, assiste novela, continua no trânsito, é assaltado, faz compras e... e "la nave va", como diria aquele que enxergava dignidade na figura do palhaço.

Yuri Ongaro (4/4/11)

terça-feira, 5 de abril de 2011

Desânimo na faculdade... culpa dos cursinhos

Alunos de faculdades públicas decepcionados com o ensino que estão recebendo. Quem são os grandes culpados? É tentador responder que é o governo, mas minha primeira resposta seria: a culpa é do mercado.


Por que? Os cursinho pré-vestibular. Vou partir do meu exemplo: as aulas eram divertidas, interessantes sim, mas os professores sempre tocam no mesmo ponto: "O importante é passar numa faculdade pública". O motivo? "É bom para o currículo" diziam os mestres. Nas particulares reina o "pagou passou".

Dado esse discurso, as instituições USP, Unesp e Unicamp se tornavam aos poucos em grandes pesadelos - e metas - de todo estudante. Se a pergunta não cai nesses vestibulares (incluindo também as federais e estaduais do restante do Brasil) não tem importância. Mas se cai, tem que saber responder. Tem que passar.

Depois disso, os cursinho só precisam somar o número de aprovados e colocar no jornal: Cursinho X, 00 aprovados na faculdade y, no curso Z.

Quando o estudante alcança o seu objetivo (ou o objetivo do cursinho?) chega na faculdade e se depara com um ensino extramente crítico ao mercado - vou me limitar a falar dos cursos de humanas e comunicação. Até aí, nenhum problema. Aliás, melhor ainda. Mas em muitos casos a filosofia de ensino de alguns cursos de faculdade públicas praticamente ignora o mercado. Centra-se na pesquisa, nos projeto sociais, nas ONGs, no trabalho acadêmico. Pouco ou quase nada fala-se do mercado. Ou critica-se o dito cujo.

O estudante que chegou empolgado para entrar no mercado se depara com aulas que não falam do mercado. Em alguns casos, quando vai buscar emprego, percebe que o peso dado a instituições públicas não é maior que o dedicado às particulares.

Aí reside a culpa dos cursinhos. Ao invés de salientar as peculariedades do modus operandi do Estado (por meio das universidades estaduais e federais) e da iniciativa privada, centra-se em inflar a idéia de que o importante é passar numa USP ou Unesp e que as faculdades particulares são indústrias do ensino [olha só quem está falando].

Claro, Fuvest e Vunesp também tem culpa no cartório. Querem abraçar o mundo nas suas provas, mas abrem pouco espaço para esse tipo de reflexão.

Resultado? O estudante que passou no vestibular, se decepciona. Os professores universitários se decepcionam com alunos "alienados" que só pensam no mercado. Os empregadores se decepcionam com os recém-formados que pouco tiveram aulas práticas. Talvez porque ouvissem falar tão bem de universidades públicas e tivessem traduzido isso para "vão trabalhar melhor para mim".

A indústria do vestibular, alimentada pelo pensamento do mercado acaba vitimando [olha só!] o próprio mercado.