sexta-feira, 22 de julho de 2011

Salário Mínimo e contas que não fecham

Talvez pela gorda ociosidade das férias letivas, este post falará sobre trabalho e salário.
Um pouco de política tangível, pra não ficar falando apenas de quem é patrão de si mesmo.
Visitei por estes dias os sites do DIEESE, IPEA e IBGE (se as siglas te deixarem curioso, clique no link), apanhei um pouco, e aproveitei os dados da pesquisa da minha amiga Ana Helena Ribas para fazer estes gráficos bonitinhos.

clique na imagem pra ver alguma coisa
Pois é, segundo o DIEESE, pra se manter uma família de três indivíduos adultos, ou de dois desses indivíduos, mais duas crianças (que consumam o equivalente a um indivíduo adulto) são necessários, no mínimo R$2194,76. Isso equivale a quase 4 salários mínimos, independente da cidade.
A relação com as cestas básicas também é crítica. Pra conta ideal, ela deveria representar no máximo 12% do orçamento familiar. No Paraná, estado onde o salário mínimo é o mais alto e a cesta básica é a mais barata, a cesta básica consome 38% dos recursos familiares. Desnecessário dizer como ficam comprometidas as outras necessidades vitais que Constituição exige que o salário mínimo assegure ( além de alimentação, a Carta também exige moradia, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, além de cobrar que o salário seja reajustado periodicamente, preservando o poder aquisitivo do salário).
Desde o início do plano Real, dá pra conferir no link do DIEESE, é evidente que o texto da Constituição é conversa. Com um mínimo de bom senso, podemos imaginar que, por mais que queiramos bancar um Estado Provedor (não tentássemos, o Estado seria inútil, ou liberal, o que dá na mesma) essa conta é muito difícil de fechar. Que 20 milhões de trabalhadores não bancam a estrutura estatal necessária pra subsidiar uma população de 200 milhões de pessoas, ainda que todo mundo fizesse muita hora extra.
Mas se o troço já é difícil, como explicar desperdícios que negritam em manchetes quais esta ou esta , uma hora dessas embalando peixes de óbvia espécie. Como alguém, eleito por pessoas que raramente possuem metade do que precisam pra custear suas necessidades vitais para tetarem fazer a conta fechar podem se dar ao luxo de esbanjar a onerosa mas insuficiente carga tributária em verbas indenizatórias e compensações de toda sorte?
Não é um apelo demagógico. É uma questão de educação e administração de recursos: se os políticos ensinarem como fazer para cumprir tudo o que a Constituição exige deles e ainda bancar suas vidas nababescas com a arrecadação percapita menor que todos os países com a mesma tarefa, convenhamos, fechar o mês com um salário mínimo vai ser fichinha.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Celebridade parlamentar e parlamentar celebridade

Novamente violando o véu da moral e dos bons costumes da classe dita politizada, nos debrucemos, com o devido respeito, sobre o grosso da matéria. Recentemente, Fábio Góis do Congresso em Foco divulgou um breve balanço da atividade parlamentar dos “deputados celebridades” no primeiro semestre de suas legislaturas. Em sua avaliação, deputados como Romário (PSB-RJ) e Jean Willys (PSOL-RJ) têm se destacado em suas atividades legislativas; assim como Francisco Everardo (PR-SP), o execrado, desprestigiado, satirizado, crucificado e tantas vezes condenado à jaula do leão, palhaço Tiririca, em proporção mais módica.

A análise é honesta e precisa sempre ser feita, se de fato louvamos a crítica aos “políticos”. No entanto é possível ir além, e comparar as atividades das celebridades parlamentares supracitadas com as atividades dos parlamentares celebridades que sempre têm voz nos compromissados jornais de horário nobre.

Dentre as celebridades que se tornaram parlamentares, pode-se observar um trabalho mais próximo das necessidades da população, fora da “sociedade política” que se instaurou no país. Romário, por exemplo, têm se dedicado a promover políticas inclusivas para pessoas portadoras de deficiência e se mostra uma figura combativa no cenário esportivo, requerendo aumento de recursos ao paradesporto e demandando explicações sobre a organização da Copa de 2014 e as sempre obscuras atividades de Ricardo Teixeira e sua CBF.

Jean Willys, “ex-BBB”, trouxe a discussão de direitos humanos às pautas do congresso. Tem batalhado pelos direitos dos homossexuais, pelo maior investimento em educação e liberdade religiosa e de expressão. É alvo de costumes higienistas, como do parlamentar celebridade Jair Bolsonaro (PP-RJ), exemplo de membro da “sociedade política”, que reina sobre nós, míseros cidadãos.

Já Tiririca tem uma postura mais tímida. Convenhamos. Entretanto não peca pela omissão, muito menos pela ausência. Já salientei a importância de sua presença na casa, e sua atividade parlamentar tem rendido mais do que qualquer um esperava. Além da grande assiduidade de Tiririca, o deputado tem representado sua classe, propondo a instituição de programas nacionais de cultura e sugerindo distribuição de material didático a alunos e educadores circenses, por exemplo.

Em contramão, muitos dos parlamentares celebridades dedicam suas atividades legislativas, seja a pormenores técnicos com a manutenção da “sociedade política”, seja à rinha partidária que tanto desvirtua o sistema representativo.

Não entro tanto no mérito dos projetos e emendas de ordem técnica e burocrática. É insuportavelmente desestimulante, para quem está fora da “sociedade política”, a leitura de solicitações de alteração de palavras no parágrafo do artigo do regimento interno de alguma subcomissão ou trâmites burocráticos assustadoramente parecidos. Muitas vezes essas solicitações são frutos da democracia, mas a emperram em sua essência.

Além da máquina política e seu burocrático funcionamento, o mal do partidarismo e suas negociatas só desestimulam o interesse pela política no Brasil. A votação da ruralista reforma do código florestal, por exemplo, foi resultado muito mais de negociações entre governo e oposição, do que propriamente de uma atenção do congresso aos impactos socioambientais da nova proposta, que não são poucos.

A diferença parece ser de postura política. Enquanto alguns veteranos enaltecem seus enfrentamentos político partidários sob as luzes dos jornais de horário nobre, há novatos como um boleiro defendendo políticas de acessibilidade, um ex-BBB resguardando direitos de minorias e um palhaço, tímido, aprendendo a legislar e apoiando projetos educacionais.

sábado, 9 de julho de 2011

"Sociedade política" e a república dos esquecidos

O ano de 2011 tem sido de fôlego adicional à engavetada democracia mundial. Durante muito tempo a sociedade civil, em geral, aceitou de bom grado as condições políticas acertadas entre certos governos e seus sócios. Hoje, porém, é possível observar um renascimento de movimentos coletivos exigindo o que Tarso Genro chamou de “democratização da democracia”.

A idéia não é nova, pelo contrário, é o fundamento da democracia de fato. Numa análise mais atenta a tratados de ciência política e consultas a pensadores como Rousseau e Tocqueville, constatamos que os movimentos coletivos pelo mundo lutam por princípios óbvios. E se o governador gaúcho usa mui habilmente essa expressão, é porque a democracia já deixou de ser democrática há algum tempo.

Temos acompanhado as revoluções árabes, encarando regimes ditatoriais e se organizando, sobretudo, via redes sociais. Levantes populares exigindo democracia, enfrentando repressão e a violência desmesurada de seus próprios governos com pouco apoio internacional.

Também o espanhol ¡Democracia Real YA!, do movimento 15M, que critica um modelo de política que privilegia uma minoria em detrimento das necessidades do povo. Com a recente crise financeira mundial, tem crescido a adesão pela Europa.

Tahrir e Puerta del Sol são exemplos mais notáveis de que, pelo mundo, diferentes povos têm questionado o regime de suas nações e procuram fazer a res (coisa) ser realmente pública. Os recentes ataques hackers no Brasil não são, nem de longe, algo parecido. Assim como movimentos exigindo redução de impostos para produtos eletrônicos, pura e simplesmente.

É preciso aproveitar mobilizações como a marcha da liberdade, e colocar em xeque a “sociedade política” e a democracia oligárquica que predomina no nosso modelo de sistema representativo. É preciso, principalmente, ressignificar a política no Brasil. Debates e atenções, por parte da sociedade civil, não devem ser exclusividades dos anos de fim par, eleitorais. É preciso agir, lembrar e trazer o poder do público também para os anos de final ímpar, época em que a democracia costuma ficar esquecida, por eleitos e eleitores, e engavetada por aqui.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

“Pelo sonho é que vamos”

As coisas que vemos são claras, entretanto exige-se um esforço distinto para observá-las com a acuidade que a matéria demanda. E não é um esforço que encerra um diferencial quantitativo, mas qualitativo, numa postura que não ignora centelhas de meias-verdades e fagulhas de abjetos interesses que um espírito menos preocupado costumeiramente deixa escapar.

O poema de Sebastião da Gama, cujo verso inaugural intitula este texto, poderia bem ser um hino de batalha daqueles que, como nós neste blog, combatem uma ainda lúgubre realidade política e social brasileira. Afinal, “comovidos e mudos” muitas vezes, pelo sonho é que vamos.

“Chegamos? não chegamos?”

Sacamos e empunhamos nossas críticas e nossos anseios sociais de nossos princípios políticos. Não são rigorosamente os mesmos, ainda bem. Contudo reconhecemos uns aos outros, em meio à fumaça e o fogo da guerra que diariamente travamos contra ‘políticos’, mídias, “a opinião pública líquida” e quimeras semelhantes. Somos frustrados muitas vezes, ossos do ofício, mas como versam os versos desse nosso hino “Haja ou não haja frutos, / pelo sonho é que vamos.”

“Basta a fé no que temos.

Basta a esperança naquilo

que talvez não teremos.”

Reconhecemos resultados nesse velejar, mas alertamos que ainda há muito a navegar. Numa terra que deu à luz as mais diversas caras, etnias, religiões, numa terra que assistiu seus filhos protagonizarem as mais diversas batalhas, aqui travamos as nossas em utopias e vírgulas, perseguindo ideais e delatando anacronismos. Conhecemos algo da nossa história e escrevemos quando a percebemos se repetir, como farsa, lembrando Marx.

“Basta que a alma demos,

com a mesma alegria,

ao que desconhecemos

e ao que é do dia a dia.”

E nesse muito ainda a navegar vamos sempre encontrar cerração, dúvidas, obstáculos do desconhecido. No entanto sabemos que nós (eu, tu, ele/ela) fazemos a nação. E por nos acreditarmos protagonistas da nossa história coletiva, gritamos pra que sejamos ouvidos. Gritamos, sobretudo, pra abafar os sedutores cantos das sereias que sempre alienaram, e ainda alienam, muitas almas brasileiras. Mas tentamos ser mais sedutores, e com a alegria (sarcástica, há que reconhecer) proclamada por Sebastião da Gama em seu poema, enfrentamos o que conhecemos e o que desconhecemos. E pelo sonho caminhamos, afinal...

“Chegamos? não chegamos?

Partimos. Vamos. Somos.”